23 de junho de 2015

Pêlo

De repente eu comecei a me tornar um chipanzé. Pêlos começaram a nascer em lugares que antes eram completamente carecas. E, claro, muita vergonha, pois não havia muitos chimpanzés por perto. Demorei pra gostar desse tanto de pêlo e gosto de não ser igual a todo mundo. Demorou muito. Hoje adoro minha barba, meu cabelo, meus pêlos...

22 de junho de 2015

Sangre

Foram três gotas grandes de sangue e muito nervosismo. O exame é rápido, mas parece ter demorado muito tempo. O que era pra ser alguns minutos viraram horas, dias, anos. Sífilis, AIDS e hepatite. Sexo, gay e tatuagem. Achei que tinha ao menos algum deles.

Entre a coleta e o resultado foram apenas alguns minutos. Várias pessoas diferentes. Gays, patricinhas, manos, homens casados, todo mundo nervoso para aguardar o veredicto. Todo mundo junto.

Um pequeno furo no dedo. Placas futurísticas e canudinhos que sugam sangue. Vinte minutos depois uma entrevista.

Quantos parceiros? Camisinha? Hã? Calma.

Nenhum reagente, só minha cabeça reagindo a mil. Nada a se preocupar, diz a moça do Centro de Triagem e Aconselhamento. Ela disse que não preciso me preocupar. Depois disso eu não ouvi mais nada. Eu só queria sair gritando e sorrindo. Não reagente. Ufa! Vieram na minha cabeça aqueles dias sem camisinha, as sessões de tatuagem e, sei lá, mais algumas coisas. Ufa!

19 de junho de 2015

Memórias

Não lembro porque deixei de vir aqui. Nem sempre tem uma razão ou um motivo, simplesmente se deixa de fazer algo que se fazia. Senti saudade e vim. Olhei ao redor, senti os cheiros, os barulhos. Lembrei de outro eu que vinha por aqui. Posso vir de novo como antes. Será? 

15 de junho de 2015

?

Eu não tenho para onde vou. Penso, tento focar e não sei. Claro, tem vários lugares para os quais posso ir, mas não tenho vontade de ir a nenhum. E também não quero ficar. E então continuo nesse lugar nenhum esperando que vire algum lugar.

14 de junho de 2015

Óculos

Uso óculos há vinte anos, desde que eu tinha uns onze anos. Não gostava, mas hoje não me incomodo. De manhã eu limpo as lentes e a visão fica super nítida, nem parece real. No decorrer do dia com a oleosidade da pele e outras sujeiras, meu óculos vira quase um filtro para um filme antigo, desses dos anos oitenta. Ou até mais antigo, dependendo da hora do dia.

12 de junho de 2015

(n)amor

Eu não tinha muita sorte com o amor. Aliás, demorei muito tempo para entender o que realmente é isso.

Nos meus primeiros namoros eu ficava impressionado como alguém podia se interessar por mim e quase morria quando, lógico, o namoro não dava certo. E depois de alguns momentos bons, mas soterrados por várias roubadas amorosas, eu desisti de encontrar alguém. Todo mundo - incluindo eu mesmo - era complicado demais e tudo isso era um desperdício de energia muito grande.

Fui curtir minha vida, sair sozinho, viajar. Eu não me achava bonito e tudo ficava mais fácil quando eu não esperava nada.

E, claro, me apaixonei de novo. Mas dessa vez eu não queria namoro, não queria nada sério. Era gostoso, despretencioso e férias. A gente se via todos os dias e num fuso horário bem diferente do resto das pessoas.

Quando percebi já estávamos morando juntos. E depois morando em cidades separadas. Depois morando juntos em uma outra cidade. E finalmente morando juntos na cidade que a gente nasceu e se conheceu.

E não importa se é dia dos namorados, se é natal, se é semana santa. A gente está junto, briga, se desespera, sente saudade, sente raiva, aprende, se apaixona de novo.

Eu estava com 24 anos quando rolou o primeiro beijo (com caipirinha e músicas dos anos 80 numa festa no subsolo de um pizzaria) e agora já tenho quase 32. E naquela época eu não pensava em nada além de curtir o dia que estávamos juntos. Se alguém me falasse que depois daquele beijo a gente ia viver tanta coisa e já com tantos anos de história, eu ia rir da cara de quem me falasse isso.

Mas eu adoro como a vida gosta de surpreender a gente.

Outro dia a gente conversou sobre qual seria a nossa música. Acho engraçado isso de gente que tem uma música. Será que é alguma dos Smiths? Será que é da Gal Costa? Ou do Coco Rosie? Do Anthony & The Johnsons. Olha, não dá pra ter uma música. Tem uma coletânea inteira e essa da Grace Jones ficou na minha cabeça esses dias: "não sou perfeito, mas sou perfeito pra você".

29 de maio de 2015

Zumbi

Acordo comum gosto amargo todos os dias. Respiro fundo quando ouço desligo o alarme do celular. E então me arrasto para o banheiro, olho o celular, notícias, fotos, besteiras. O espelho mostra como seria minha versão em um apocalipse zumbi. Por que será que nos filmes os zumbis gritam "Cérebro?". Vou atrás da minha comida de zumbi na cozinha. Tem vezes que não tem nada, outras vezes o pacote de tapioca me olha. Cérebro! Tem vezes que minha versão zumbi me acompanha durante o dia inteiro. Eu já nem faço mais a barba, meu cabelo não tem mais corte e nem ligo para as minhas roupas. Cérebros... Cadê o meu?

28 de maio de 2015

Coisas velhas

Eu adoro coisas antigas. Ou coisas que parecem ser antigos. Filmes, músicas, roupas, acessórios, sapatos, coisas de cozinha, discos de vinil, botas, óculos, livros, tatuagens.

Fico fascinado quando vou a um brechó, museu ou prédio antigo. E imagino como deve ter sido viver naquela época.

E acho incrível quando leio um livro de um autor que já morreu, um filme antigo em que todos os que participaram já morreram, escuto um disco de um cantor morto há anos. As pessoas morrem e as coisas que elas produziram continuam.

O envelhescimento não pára. Meus cabelos ficam brancos, as rugas cada vez mais marcadas. Uma dor nas costas, uma alteração nos níveis do sangue. Cada dia é menos um dia. E isso é ótimo! Imagina não envelhecer e viver para sempre? Eu não ia querer. Claro, eu ia adorar viver muito tempo, mas sabendo que um dia vou morrer!

27 de maio de 2015

Vagão de mulheres

Assim que passei na catraca vi que já havia um metrô na estação e que logo as portas fechariam. Seriam só alguns minutos de espera até o próximo trem, mas preferi correr e entrar no primeiro vagão disponível.

Corri e consegui entrar. Vem aquela sensação de vitória e a música do Ayrton Senna começa a tocar dentro da minha cabeça. Ou a do Missão Impossível. Peguei o celular e o trem começou a andar. Depois de algumas estações eu notei que só havia mulheres ao meu redor. Altas, baixas, gordinhas, magras, estudantes, secretárias, funcionárias públicas. Um vagão só de mulheres.

E então me dei conta que havia entrado no carro exclusivo para mulheres. Eu nem sabia direito que existia esse vagão, pois ele entrou em vigor em 2013, quando eu morava em São Paulo. No horário do rush, tanto no começo da manhã quanto no final da tarde, o primeiro vagão é exclusivo para mulheres a fim de evitar assédio e violência contra elas.

Eu realmente não tenho ideia do que é ser mulher e conviver diariamente com a possibilidade de que um maluco venha dar em cima ou até mesmo provocar algum tipo de violência sexual. Acho péssimo ter que existir um vagão que isole as mulheres, afinal elas não têm culpa que existam malucos e tarados, especialmente depois de um dia cansativo de trabalho.

Mas essa iniciativa conscientiza as pessoas para entender que realmente é um problema que existe e afeta muitas mulheres todos os dias.

Imaginei se eu tivesse que andar num carro isolado com medo de algum tipo de violência sexual. Ou se além de me preocupar com assaltos quando caminho até minha casa, também teria que me preocupar com estupro. Simplesmente não é uma preocupação para mim. Ninguém pega na minha bunda, ninguém assobia quando eu passo, ninguém me encoxa.

Nenhuma das mulheres ali do vagão me olhou de cara feia ou pediu para que eu saísse, mas é estranho se sentir fora de lugar e inadequado.

Quem sabe um dia acabe essa cultura machista que faz com que os tarados ou malucos se sintam no direito de assediar e estuprar mulheres e que não seja mais necessário um vagão só para mulheres.

E que eu preste atenção e não entre mais no vagão delas no horário do rush!

26 de maio de 2015

Paisagens

Você entra em um casulo de metal, geralmente sozinho, e segue para o trabalho junto a outros casulos de metais, em geral também só com uma pessoa em cada, e esquece de tanta coisa que acontece ao redor.

Resolvi vir ao trabalho de transporte público hoje. Uma parte do percurso de metrô e outra no ônibus da empresa.

Sair de casa e caminhar alguns minutos a pé nessa manhã ensolarada e fria. Um sol tão suave. E então a estação de metrô. De cara já tive de esperar uns três trens passarem até eu conseguir me jogar em um pequeno espaço lá dentro. Sempre cabe mais um. Sair do casulo te coloca em uma situação cheia de vida, com tudo de bom e ruim da vida em coletividade. Pessoas de todos os jeitos, alguns com livros, outros segurando bicicletas, outros dormindo sentados no chão.

A paisagem lá fora passa depressa. Em alguns trechos parece até uma área rural, com campos verdes e poucas construções.

Não canso de olhar para as pessoas e imaginar histórias. Um adolescente ao meu lado resolveu um cubo mágico em alguns minutos. Eu não imaginei que adolescentes ainda gostassem de cubo mágico. Eu nunca consegui resolver um. E fiquei hipnotizado com O brinquedo que girava na mão de rapaz de forma tão rápida, nem parecia que ele prestava atenção nos próprios movimentos. De repente, todas as cores ficaram organizadas. Eu quase dei parabéns a ele, mas achei melhor não. Era muito cedo na manhã e ninguém gosta de conversar nessa hora. Aliás, ninguém gosta de conversar com quem não se conhece, ainda mais dentro do metrô.

E havia homens engravatados, homens com roupas simples, pessoas de chinelo, garotas de uniforme da escola. Próxima parada: estação central.

A Rodoviária é impactante. Um prédio que não se sabe direito se é um viaduto ou um monumento. E com camadas inscrustadas de sujeiras ancestrais e fuligem.

Quero tirar fotos do céu azul, as linhas dos prédios, as pessoas, mas sinto um leve desespero, pois não sei direito onde o ônibus da empresa fica estacionado. Procuro rostos familiares, crachás, mas encontro filas, pastel, café, pedintes. Finalmente vejo o logo da empresa que eu trabalho estampado na lateral do ônibus.

Quando a gente mora há muito tempo na mesma cidade e faz os os mesmos caminhos todos os dias acaba por ficar meio anestesiado com a paisagem. Hoje dentro do ônibus eu me senti meio estrangeiro na Esplanada. Esse céu azul sem nuvens, os prédios pintados de branco, as pessoas apressadas. Pensei nos arquitetos, engenheiros e peões que trabalharam nas obras da construção da cidade, lá no final da década de 1950. E achei aquilo tudo tão bonito.

Eu queria ter continuado eternamente dentro do ônibus com a cidade passando devagar. Para qualquer lugar. Uma música gostosa nos fones de ouvido. Queria viajar. E então peguei meu crachá, olhei a foto ali já meio esmaecida. Respirei fundo. Quem sabe um dia.

25 de maio de 2015

Vida de abelha

A vida fica cheia de regras com o passar dos anos. Horário pra dormir, pra acordar,  pra chegar ao trabalho, pra almoçar, pra voltar pra casa. Comer direito, fazer exercício, tomar remédio...

De vez em quando é bom não seguir tantas regras. Beber demais, chegar de manhã em casa, dançar muito. O ruim é que a ressaca é dura e o corpo demora a se recuperar. Ontem eu não existi para nada antes das 18h.

Mas vale a pena! A vida de abelha não compensa. É preciso rir, se divertir, extravasar. Não sempre, claro! Mas tem dias que é preciso chutar o balde...

22 de maio de 2015

Sensual

Sensualidade é difícil de explicar. Não tem a ver com beleza, apesar de geralmente as duas coisas estarem associadas. Há pessoas lindas que não são nada sensuais e há pessoas que não tem lá grande beleza, mas são extremamente sexies.

O Jack Nicholson, por exemplo. Ele nunca foi um cara bonito, mesmo quando era jovem. Mas é um homem muito sensual até hoje. A Marilyn Monroe nem precisa comentar nada, sensualidade e lindeza.

E sensualidade é algo intrínseco. Não tem como aprender, não tem como ensinar. Ok, a pessoa pode aprender um truques, mas não fica natural. Falta aquele "je ne sais quoi".

Tem gente que consegue até mesmo beber água de forma sensual. Um copo de água sexy? Sim. Já vi. Não sei fazer igual. E nem precisa de câmera lenta e nem derramar água no rosto e nos cabelos com os olhos fechado balançando a cabeça de um lado para o outro. Aliás, será que isso é sexy?

Eu estou na categoria não-sensual. Sempre fui desengonçado, desde pequeno. E sempre tive uma barriga nada sexy. Nunca me senti muito confortável com meu corpo.

Tenho cara de bonzinho. Isso. Bonzinho. A pessoa olha pra mim e automaticamente já pensa que eu sou alguém tranquilo, limpo, cristão, que não mente e trabalha direito. Sempre foi assim. Eu escutei a frase "Por que você não é mais como o Vincius?" a infância inteira. E já consegui trabalho por que a entrevistadora (e futura chefe) foi com minha cara, "Fui com sua cara, você parece ser um cara decente".

Tentei ser sexy. Comprei lentes de contato, comecei a fazer natação, fiquei mais bronzeado e mais tonificado. Mas é uma cara de bonzinho em cima disso. E minha voz é de bonzinho. Não é voz sexy, forte, mas uma voz tranquila. Todo mundo acha que sou mais novo do que realmente sou. Uns cinco anos a menos pelo menos.

Tem dias que eu me sinto mais inspirado. Ajeito o cabelo, não faço a barba, coloco minhas lentes de contato, visto aquela camisa bacana e coloco minha bota. Nesses dias sinto vontade de fumar. E fumo e bebo muito. E danço. E converso. Nem parece que sou eu mesmo. Em geral dá merda e acordo com ressaca física e moral. E se tiver outro tipo de ressaca eu também tenho após esses dias (ou melhor, noites) de sensualidade.

Mas claramente não sou eu mesmo. Talvez seja o Victor (ainda não sei direito o nome da entidade que aparece aí na foto). E ainda não aprendi a chamá-lo, talvez seja a vontade de fumar, logo eu que não fumo nunca, tão certinho. Eu também nunca exagero na bebida, mas nesses dias sinto uma sede insaciável.

Não são muitas as vezes que eu saio assim. Em geral eu sou mais 'mãe americana' dos programas de transformação de imagem. Apesar de não ter filhos e nem ser americana, eu compartilho essa preguiça de investir muito no visual.

Depois de assistir vários episódios desses programas - que são todos iguais - percebi que basta um corte de cabelo repicado, dentes de resina em cima daquela mandíbula podre, cirurgia de miopia, depilação a laser, clareamento de manchas de pele e umas roupas estampadas. Mas não é nada sexy, ao menos não para mim. A pessoa desengonçada está ali atrás, dá pra ver. É tudo encenação. vai passar uma semana e o espírito de "mãe americana" volta com tudo.

Talvez seja a hora de deixar essa "mãe americana" de lado e investir mais no visual. Deixar essa "bonzisse" que várias vezes me mutila e aceitar minha maldade.

Quem sabe embaixo dessa carcaça de bonzinho não tem um cara sexy?

21 de maio de 2015

Eu, trombadinha

Aparece um problema e é preciso encontrar uma solução. Simples assim.

Nessa semana me deu vontade de andar de bicicleta após algumas semanas sem nem lembrar que eu tinha uma bike na garagem.

Troquei de roupa e desci correndo. O cadeado de segredo travou. Coloquei várias senhas e nada. Girei, puxei, tentei. E nada. E então notei que o cadeado estava meio estranho. Não que alguém tivesse tentado arrombar, mas sim que ele próprio cedeu com o peso da bicleta.

Peguei algumas ferramentas que tinha em casa e me imaginei um trombadinha com a missão de arrombar o cadeado. Um alicate e uma tesoura. Quase uma hora apertando e puxando e nada. Desisti. O cadeado estava bem desgastado, mas nada de abrir.

Dia seguinte mais uma tentativa, afinal de contas eu tinha que dar um jeito ou ao menos tentar algo. Cortes e calos nas mãos e nada. O alicate quebrou e eu continua usando a tesoura e o que mais eu tinha por perto. Eu quase desisti, quando finalmente o cadeado soltou.

Tirei três conclusões: 1. Nenhum cadeado é realmente seguro, basta um pouco de empenho do trombadinha; 2. Uma pessoa pode tentar arrombar um cadeado de bicicleta no meu prédio e ninguém diz nada e 3. É muito bom quando a gente se propõe a algo e consegue concretizar, apesar da pouca chance de sucesso.

E ainda nem consegui andar de bicicleta! Vou ver se hoje consigo dar uma volta.

20 de maio de 2015

Criogenia

O congelador é um mundo inexplorado e não sei direito o que tem lá dentro. Eu me sinto como um Indiana Jones no Ártico: encontro um pedaço de algo congelado e tento descobrir o que será deve ser aquilo. Será que é comestível? Será que vai me matar?

Já descongelei uma pedra de gelo vermelha que só poderia ser bife. Mas na verdade era carne moída. Já era meus planos de comer um picadinho, mas então fui fazer um quibe. A vida do dono-de-casa é assim.

Eu já abri potes de sorvete jurando que era de chocolate, mas era só feijão.

E tem frutas esquecidas desde o natal (será que vou usar aquelas cerejas para alguma coisa?). Tem caldo de legumes caseiro. Tem até algumas claras congeladas que sinceramente nunca vou usar. Eu sei, guardei porque fiquei com dó de jogar fora em um receita que pedia muitas gemas e pensei em fazer suspiro, pudim de claras ou até mesmo tentar macarrons, mas eu sei que não vai rolar.

Comecei a tentar esvaziar meu Polo Norte. Trouxe pro almoço um pedaço de torta de fango que estava há muitos meses por lá. Fiquei com receio, cheirei, provei e realmente ainda estava gostosa. Freezer + microondas e eu me sinto meio Jetsons: você tira de uma máquina, coloca em outra máquina e come.

A porta dessa era glacial quase não fecha. Outro dia achei que estava muito bagunçado e tentei arrumar tudo, mas ficou de um jeito que não fechava mais a porta. É um quebra-cabeça. Tirei tudo de novo e arrumei como estava antes de tentar arrumar. A porta fechou.

Quando minha mãe vem me visitar ela sempre me leva uma sacola de coisas congeladas: frutas do quintal, empadão, pão de queijo. Eu digo para ela que não cabe, mas de alguma forma mágica ela faz o impossível: torna um congelador abarrotado em um abarrotadíssimo. E a porta fecha. Isso que importa! Joga lá dentro, fecha a porta e esquece.

Aliás, minha mãe é uma expert em congelamento. Ela tem um freezer horizontal no quintal e dois verticais na cozinha. Quando eu era pequeno e não tínhamos empregada, minha mãe contratava uma cozinheira para fazer pratos e porções para congelar. A moça trabalhava um dia inteiro sem parar. Acho que não existe mais esse tipo de serviço e eu não me imagino contratando algo parecido.

A minha última geladeira tinha um congelador interno, desses que a camada de gelo vai crescendo um pouco todos os dias. Esqueci um pote de sorvete lá dentro e ele ficou soterrado no gelo. Foi terrível, mas era lindo ver aquele monte de neve dentro da geladeira. Eu nunca vi neve de verdade, essa é a minha neve. E o feltro na época das decorações de natal.

Hoje meu congelador é frost-free (ou frósfri). Não tem neve, mas agora cabe mais coisa. Cabe um frango inteiro, muitas peças de queijo e, quem diria, até formas de gelo vazias.

19 de maio de 2015

Gotas

O caos faz sempre parte da vida. Quando tudo está muito certo, uma hora vai surgir uma bomba para bagunçar tudo.

As bombas caem o tempo todo. Algumas são uns estalinhos de festa junina. Outras são cogumelos nucleares com efeitos que duram um bom tempo.

A última bomba que caiu me jogou para fora da órbita da Terra. Fiquei flutuando um bom tempo sem saber exatamente para onde ir, mas não estava ruim flutuar sem rumo.

Aos poucos voltei pro planeta, encontrei algumas coisas que me fazem bem e comecei a pensar em rumos pra reconstrução.

Acordei atrasado para vir ao trabalho e vi umas gotas nas folhas da planta que fica na sala (uma Monstera deliciosa). Achei aquilo tão bonito que tive de tirar uma fotografia. E pensei que a planta não controla muito onde ela está. Ela no máximo vira as folhas em direção ao sol, além de soltar algumas gotas de água pela transpiração. E assim ela sobrevive.

Talvez eu tenha começado a sentir a direção em que o sol está.

18 de maio de 2015

Primeiro passo

A gente sempre tem uma ideia do que precisa ser feito para chegar a algum resultado. Nem sempre é certa, mas em geral leva ao caminho certo.

A barriga, por exemplo. Para emagrecer é preciso comer direito e fazer exercício. Simples assim. Mas por que é tão difícil colocar em prática?

Para se chegar a algum resultado é preciso rotina e consistência. É um esforço diário. Todo dia um pouco. Ou então é melhor nem se enganar e assumir logo a barriguinha de cerveja, o que também não é nenhum problema. Ruim é essa insatisfação entre querer emagrecer, mas não fazer nenhum esforço para isso.

É tão melhor chegar do trabalho, comer uma besteira e ver TV e internet até a hora de dormir.

O mesmo pensamento se aplica quando se quer guardar dinheiro, mudar de emprego, estudar. Tudo é muito simples na teoria. Mas na prática, a teoria é outra.

E nunca vai chegar aquela vontade avassaladora de correr, guardar dinheiro e fazer algo que será bom a longo prazo. É sempre complicado sair da inércia, da preguiça, do "eu mereço".

Mas é preciso dar um primeiro passo.

15 de maio de 2015

Ressacas

Nem lembro a última vez que saí no meio da semana. Com o tempo a vida fica cada vez mais cheia de responsabilidade e mais cotidiana.

E então eu saí ontem para um samba numa quinta-feira. Hoje acordei com uma bomba dentro da minha cabeça e o último lugar que queria estar era o escritório.

Apesar de estar aqui com a cabeça explodindo, essas escapadas no dia-a-dia são imprescindíveis. Ou então a vida vira um manual cheio de regras rígidas: dormir tantas horas, comer bem, chegar no horário.

A vida precisa ser mais leve, ser mais descontraída. E uma ressaca num dia de trabalho pode não ser a melhor coisa do mundo, mas é tão bom dar uma quebrada no cotidiano e lembrar que tem tanta coisa pra se fazer numa noite de semana.

14 de maio de 2015

Moscas e borós

A gente contruiu torres imensas para morar e ficar cada vez mais longe do chão, talvez para fugir dos bichos que moram próximos ao solos e ficarmos mais assépticos.

Mas os bichos não se importam com a distância, talvez sintam falta da gente. Querem ficar próximos a nós e à nossa sujeira. Devem gostar do nosso cheiro.

Hoje quando acordei tinha uma mosca parada no vidro da janela. Ela voou mais de quarenta metros pra vir me ver, comer minha comida, colocar seus ovos. Pensando assim, ela merece estar ali e usufruir de todos os benefícios.

Acho que acordei de bom humor e a deixei do mesmo jeito que encontrei, parada no vidro.

Quando eu voltar talvez ela tenha ido embora. Ou tenha conversado com as traças que teimam em aparecer. Formigas e baratas eu ainda não vi por ali, mas outro dia tinha uma lagarta no vaso de hortelã que comprei. Os piores visitantes, sem dúvida, foram as larvas de mosquito que surgiram na lixeira da cozinha.

Já tinha mais de duas semanas que eu não trocava aquele lixo, então mereci ser recepcionado por vários borós. Aliás, esse nome parece ser de algo tão simpático e não mini minhocas filhas de moscas. Não foi uma cena bonita ver vários grãos de arroz se mexendo e agora quando cozinho troco o lixo na mesma hora. Malditos borós.

Será que a mosca que veio me visitar hoje de manhã foi um daqueles borós?

13 de maio de 2015

Corporativo

Sempre trabalhei em ambiente corporativo. Mesa, computador, roupa social, caneca, divisórias e conversas próximas ao filtro de água e à garrafa de café.

Sonho em trabalhar em algo diferente. Fora do escritório talvez. Meu próprio negócio? Uma ONG? Não sei ainda.

Trabalhar em um ambiente corporativo é bem cômodo. Há vários graus de hierarquia, modelos para os documentos a serem produzidos, etiqueta para reuniões, há espaço para conversas descompromissadas, há cursos de capacitação, em geral os horários de expediente são cumpridos e, o melhor, férias remuneradas, décimo terceiro.

Apesar da comodidade, uma hora o trabalho, mesmo que exaustivo, começa a ser pouco e passa a não suprir a necessidade de fazer algo relevante, algo mais em sintonia com quem queremos ser. E agora?

Ler, pesquisar, entender a si mesmo e finalmente chegar à ideia de qual será a nova profissão. Parece bem simples. Mas na verdade dói e dá muito medo. Medo de não conseguir dinheiro, de largar algo certo. Uma hora tem que sair algo!



12 de maio de 2015

Propósito

Acho incrível quando vejo pessoas que encontraram o propósito de suas vidas e mudam tudo, reviraram-se e fazem algo de relevante. Gente que largou o emprego na multinacional para ajudar refugiados na África, outros que fundaram uma start-up e ainda aqueles que escreveram livros, fizeram filmes, abriram baladas. Na verdade, adoro histórias que começam com "largou seu emprego e foi fazer o que realmente tinha vontade".

Largar o emprego é assustador, mas nem sempre significa aterrissar no seu propósito de vida. Eu tive essa experiência há alguns anos. Não larguei meu emprego, apenas tirei uma licença não remunerada de três anos. E fui atrás do que eu estava com vontade: trabalhar com meio ambiente em São Paulo. Entrei em um escritório de advocacia ambiental e fiquei lá por quase todo o tempo da licença. Foi uma experiência incrível e não me arrependo. Aprendi um monte de coisas, mas ainda não sintia como se estivesse no emprego certo.

Não consegui encontrar ainda qual o meu trabalho. Voltei pra Brasília e para o meu emprego anterior. E desde então tenho lido vários textos sobre vida, empregos significativos e tudo mais. Mas nada ainda. Parece que tem uma barreira que me impede de sequer pensar no que eu deveria fazer.

Meu trabalho atual tem uma carga de trabalho tranquila e trabalho oito horas por dia. Eu poderia então pensar em um hobbie ou emprego que eu pudesse conciliar até que eu ficasse só com esse novo emprego.

E então comecei a pensar nos meus hobbies, nos meus interesses, no que eu realmente gosto de fazer no meu tempo livre. E no que eu estaria disposto a abrir mão. Nada ainda. É tão frustrante!

Eu gosto de cozinhar, mas não quero ter restaurante ou café. Pensei em começar a escrever um blog de gastronomia, mas não simplemente com receitas. Pensei em algo mais exótico. Ingredientes diferentes, receitas malucas e um bom design.

Adoro escrever, adoro a internet, adoro cozinhar e tirar fotos. Talvez seja um bom começo rumo a um trabalho mais significativo. Quem sabe!?

Hoje faz quatro meses que voltei para o meu emprego antigo e ainda não fiz nada para mudar.