17 de julho de 2023

Pequeno currículo



Quando eu era pequeno tive uma fase de querer ser arqueólogo, especificamente no Egito. Eu lembro de ficar encantando com um livro da Larousse que tinha na estante da sala na casa dos meus pais. Um livro de capa grossa e com muitas fotos coloridas de pirâmides, estátuas e paredes cheias de hieroglifos. Eu não tinha essa mesma paixão com os livros sobre Grécia, Roma ou Mesopotâmia. O Egito e Nefertiti me davam uma faísca de aventura, mas não segui em frente. Eu já sabia ler, pois foi a primeira vez que vi a expressão "além-vida" e tive que pedir ajuda aos meus pais para entender que era o céu (ou inferno) dos egípcios antigos. Eu devia ter uns cinco ou seis anos.

Um pouco mais velho eu gostava de me imaginar em um escritório com persianas verticais de metal que estão em vários edifícios da Esplanada dos Ministérios. Não sabia bem o que eu faria, mas estava em um escritório com mesa de madeira, gavetas, roupas de trabalho, café. Eu adorava ir ao trabalho no meu pai. Lembro dos copos descartáveis em formato de cone de papel, as máquinas de escrever com uma grande esfera de metal cheia de letras, números e símbolos e de não alcançar o botão para chamar o elevador, então meu pai me deixava pisar em um de seus pés e ele me subia até eu poder apertar o botão redondo que se iluminava até que a porta de metal se abria. Meu pai deixou de trabalhar nesse lugar depois que o Collor virou presidente e mandou embora todo mundo. Eu tinha seis anos.

Na época da faculdade eu pensei em grandes trabalhos. Juiz, promotor, defensor público e embaixador. Talvez para o Rio Branco eu cheguei a fantasiar mais e até fiz um curso inteiro de francês de nove semestres. Nunca cheguei a fazer nenhuma prova para nenhum desses cargos. E nunca mais estudei francês. Sonhava em morar em outro país, virar uma grande referência, publicar livros, dar palestras. Mas não tinha ideia sobre o que.

Um pouco antes de me formar uma amiga da faculdade me chamou para fazer uma prova de nível médio para um lugar que nunca tinha ouvido falar. Estudei um pouco e passei. E continuo aqui depois de quase quinze anos. Nunca foi meu sonho trabalhar aqui, mas gosto de ter um trabalho mais tranquilo em que tenho horário certo, o salário cai certinho na minha conta, tenho férias, licenças, cursos e o salário é muito bom para a minha vida. E nos últimos anos trabalho de casa. 

Já tive algumas crises pessoais sobre precisar de um trabalho melhor, com mais prestígio e um salário ainda maior. Mas então cheguei à conclusão que é uma busca sem fim. Sempre haverá um trabalho melhor, com mais prestígio e com um salário ainda maior. Sofri muito por me comparar com colegas da faculdade e do trabalho, mas então me deu um estalo de que cada um sabe o que é melhor para si. Eu gosto de uma vida mais tranquila, gosto de trabalhar nos bastidores, longe dos holofotes e amo trabalhar de casa. O principal para mim é tranquilidade. 

Eu gosto de trabalhar, mas gosto muito mais da minha vida fora do trabalho. Poder ler depois do almoço, tirar uma soneca, caminhar aqui por perto com meu cachorro, passear nos fins de semana, viajar de vez em quando e não ter dívidas. Não preciso de muita coisa. Eu realmente me sinto satisfeito com minhas escolhas. Não tenho uma carreira espetacular, não sou referência para nada, não tenho um salário alto e não mudei de país ou de cidade. É muito provável que eu não vá mudar nada no mundo e tudo bem. Aliás, como não pretendo ter filhos, acho que pouco tempo depois da minha morte ninguém vai se lembrar de mim. Mas sinto que minha vida é leve e por enquanto me sinto feliz.

Vou fazer quarenta anos daqui a algumas semanas. Pode ser que mude de ideia várias vezes e siga um rumo profissional que eu ainda nem imagine. Mas por enquanto estou feliz com minha vida profissional e pessoal.

14 de julho de 2023

Garganta



Tinha tanto tempo que eu não ficava com dor de garganta, acho que foi antes da pandemia. Nem lembrava como era sentir esse arranhado ao engolir. A percepção de virose mudou muito depois da pandemia. Mas os vírus continuam por aí. Tomei própolis, gargarejei, tomei muita água e tentei me alimentar da melhor forma possível, inclusive com alguns mimos. Já estou melhor, os primeiros sintomas foram na segunda e a virose costuma durar uma semana. Ufa!

4 de julho de 2023

Choro e rio



Eu fui uma criança chorona. Sentia a garganta apertar e as lágrimas escorriam pelo meu rosto. Eu não conseguia segurar minha emoção. Chorei muito, mesmo quando faziam piada. E então cresci e aprendi a conter as lágrimas. Fico muito tempo sem chorar, mesmo em filmes ou séries. As lágrimas e as emoções estão lá e uma hora a represa não consegue segurar. Domingo chorei muito. Uma série de coisas e emoções juntas. Chorei até meus olhos arderem e senti um cansaço como há muito tempo não sentia. Chorar parece ser um sinal do corpo de que a gente não é uma máquina. As emoções se acumulam e uma hora precisam correr como um rio. Abri as comportas e esse rio caudaloso correu livre, formou duas cachoeiras. Depois disso meu corpo e minha cabeça relaxaram e eu pude entender um pouco mais da vida. Espero não ficar tanto tempo sem chorar.