24 de agosto de 2023

Memórias, framboesas e acaso



Um docinho simples me levou para um lugar cheio de neve e boas memórias, uma versão mais latina das madeleines de Proust. As franui são framboesas cobertas em chocolate branco e depois chocolate preto. São vendidas em vários lugares na Argentina, mas conheci quando fomos para Bariloche em 2017. E agora são vendidas aqui perto de casa pelo dobro do preço. Mas tudo bem, não é para comer todos os dias. E que maravilha ter essa parceria entre a Argentina e o Brasil. Estava no calor e secura de Brasília e de repente estava neve da Patagônia.

E tenho reparado que como eu não tinha a menor ideia que eu poderia ir a pé comprar franuis, chegou uma mensagem da minha antiga chefe, da época que eu morava em São Paulo. Ela está em Brasília para reuniões de trabalho e me chamou para tomar café da manhã no hotel em que ela estava hospedada. Envelhecer em geral tem sido bom, mas uma das coisas que tenho reparado é a aversão a novidades. Eu adoro minha rotina e não gosto muito de surpresas. Mas então lutei contra essa inércia e respondi que toparia o café da manhã. Já comecei a pensar na roupa, chequei onde fica o hotel, liguei para lá para perguntar o valor do café da manhã para quem não é hóspede e se tem garagem, fiz a simulação do Uber. No dia seguinte acordei mais cedo do que de costume, tomei banho, me arrumei e saí super cedo de casa. Fiquei com um frio na barriga. E foi ótimo o encontro, falamos das nossas vidas, dos nossos trabalhos, lembramos de casos de trabalho e no final foi apenas dois amigos se encontrando para conversar, como se não tivéssemos ficado tanto tempo sem se falar.

E hoje veio a primeira chuva depois de mais de dois meses!

Então é importante sair da rotina e aceitar o acaso. Podem ser framboesas congeladas cobertas de dois tipos de chocolate, encontros entre amigos que moram em cidades diferentes ou a chuva depois da estiagem.

9 de agosto de 2023

Quase metade



Estar perto dos quarenta tem me feito pensar no envelhecimento. O tempo passa muito ligeiro e mesmo os marcos temporais parecem que não aconteceram há tanto tempo. Escola, formatura, primeiro emprego, casamento, todos parecem que aconteceram outro dia. E, se tudo der certo, talvez eu esteja na metade da minha vida. Não sei como vai ser a próxima metade, mas tenho gostado de como levei a vida e como fui levado também. Gosto de quem eu sou hoje. Aliás, acho que demorei a gostar de mim, mas nos últimos anos gosto de quem eu vejo no espelho e consigo deitar tranquilo minha cabeça no travesseiro e pensar nas escolhas que fiz e que deixei de fazer. Penso nos livros que vou ler, nos filmes que vou ver, nos shows que vou curtir, nos países e lugares que vou conhecer, nas experiências que vou ter, nos momentos com minha família e amigos. Mesmo com uma perspectiva ambiental, econômica e política tão catastrófica para os próximos anos, espero ter qualidade de vida. Espero rir muito, comer coisas gostosas e entender cada vez mais, assim, no intransitivo mesmo, entender. Simplesmente entender. E aprender.

3 de agosto de 2023

Pode vir com calma



Tenho pensado cada vez mais que a vida está nas pequenas coisas. Poucas pessoas realmente vão fazer algo importante e serão lembradas. A maioria de nós vai ter uma vida simples e isso é muito libertador. A ambição e a comparação com as outras pessoas me deram um trabalho danado. Gastei muita energia para tentar ser quem eu não era. Eu não quero um emprego extraordinário e um salário gigantesco. Não quero me estressar todos os dias e trabalhar nos finais de semana. Quero uma vida tranquila, simples. Tenho prestado mais atenção em coisas simples que me dão alegria: olhar as plantas, o céu e o horizonte pela janela, admirar o por-do-sol ou uma lua cheia, caminhar aqui por perto e prestar atenção nas árvores e nos pássaros, ler livros depois do almoço, poder tirar um pequeno cochilo antes de voltar a trabalhar, passear com meu cachorro e poder brincar com ele. Eu gosto da vida simples e gosto das escolhas que eu fiz. Não sei como serão os próximos quarenta anos, mas eu gostei dos quarenta que eu já vivi. Posso olhar para minha versão criança lá nos anos oitenta e falar: "vai dar tudo certo, pode vir com calma".