21 de março de 2015

O Mar

Moro a uns mil quilômetros do mar mais próximo, bem no meio do país. Não sei como seria viver perto do oceano, pois o máximo que morei na praia foi por seis meses.

Lembro que nessa época sempre que me sentia triste ia ver o por-do-sol em qualquer praia da cidade e de repente a tristeza já nem era mais tão importante. E fiquei com a pele tão queimada que muita gente achou que eu era indiano.

O mar me deixa hipnotizado com o barulho rítmico, as cores, o cheiro. Entro no mar e sinto uma ancestralidade, quase uma volta pra uma casa que saí há muito tempo, que já não me lembro muito bem. Como ver uma foto da casa dos avós, em uma cidade bem distante que a gente visitou quando era quase muito pequeno para lembrar.

Quando entro no mar procuro conversar, mas não com alguém, mas com algo muito antigo e muito grande. E ouço a resposta pelo barulho das ondas quebrando. Sinto o abraço da água, além de sentimento ou sensação. Fico tão insignificante que só me resta pedir ajuda para achar meu rumo, pra cortar essas amarras que me prendem a tanta coisas que já nem sei bem a que. Pulo por baixo das ondas e sinto a espuma passar forte por minhas costas. Escuto vários sons quando estou submerso.

Posso ficar horas olhando o vai e vem, a arrebentação, encho meus pulmões com esse cheiro salgado, úmido e antigo. Sinto uma melancolia, mas que não chega a ser triste.

Algumas vezes quando entro na maré baixa enxergo minha perna de criança de três, quatro anos entrando no mar. Daquela sensação de não saber se estou indo pra frente ou pra trás quando o mar puxa a areia embaixo dos pés.

Quase nunca sinto medo do mar. Uma vez tinha uns quinze anos e estava na praia com minha mãe. Já não dava mais pé e eu não conseguia voltar. Mas não senti medo e nem vontade de nadar para a costa. Achei que minha vida tinha sido boa e que não tinha problema ir embora. Não gritei, não ouvi minha mãe. Mas chegou um salva-vidas e me tirou de lá. Até hoje não entendo essa sensação.

Outra vez viajei de barco com meus pais para uma ilha perto da cidade da minha mãe. Na volta choveu e o mar estava muito bravo. Eu, minha mãe e meus irmãos conseguimos sair quando o barco chegou no porto. Meu pai ficou embarcado e teve que sair do pier junto com a tripulação para voltar só quando o mar ficasse mais calmo. Chovia muito e voltamos pra casa da minha avó com muita tristeza. Eu rezei muito ou o que eu achava que era rezar com cinco, seis anos. Achei que meu pai não ia voltar e fiquei com muita raiva do mar. Meu pai voltou e me arrependi de ter sentido raiva e medo do mar.

Um dia vou morar perto da praia. Não sei quando e nem por quanto tempo. Mesmo no inverno. Imagino uma casa pequena numa cidade tranquila, ouvindo as ondas quando dormir e acordar, abrir as cortinas e as janelas e olhar a praia. .

Um dia vou entender essa paixão oceânica.

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